
De 2018 para cá... E agora?
Desde 2013, estamos vivendo aquilo que alguns sociólogos chamam de processo de abertura societária, um impulso que age na sociedade de modo geral e em suas instituições. Trocando em miúdos, seria o momento em que protestos políticos ganham tamanho e repercussão significativa que transbordam os limites dos setores mais mobilizados e invadem toda a sociedade. Diferentes perspectivas e reivindicações vêm a público, e tanto a esquerda, como a direita se encontram nesse imenso campo do fazer político. Projetos diametralmente diferentes, ao fim, com uma indignação em comum. Quando isto terminará e como, não sabemos!
É neste espaço-lugar que mulheres negras têm posicionado suas pautas políticas e ganhado repercussão nos últimos anos. “Diversas, mas não dispersas”. Há uma famosa foto de Marielle Franco (1979-2018) vestindo uma blusa com esses dizeres. Na foto, Marielle está diante da tribuna da Câmara Municipal do Rio de Janeiro, discursando. Marielle foi eleita vereadora da cidade do Rio de Janeiro com 46.502 votos em 2016.
No dia 14 de março de 2018, Marielle foi assassinada. Ocupando o lugar de escândalo internacional, diversas forças políticas se mobilizaram a fim de cobrar uma solução a este crime bárbaro, possivelmente associado com as brigas que Marielle enfrentou contra as milícias cariocas que seguem ocupando imensos territórios na cidade. O assassinato segue sem solução definitiva. Passados quatro anos, Ronnie Lessa, ex-policial militar reconhecido como um dos matadores de aluguel do grupo chamado Escritório do Crime, foi preso, porém o mandante do crime segue desconhecido.
No pleito daquele mesmo ano, seu partido de origem (PSOL) e outras legendas progressistas lançaram diversas candidatas mulheres negras em um fenômeno à época chamado pela mídia de “efeito Marielle”. Quatro delas diretamente ligadas à figura da vereadora, sendo uma sua amiga pessoal e outras três ex-assessoras: Taliria Petrone, Mônica Francisco, Dani Monteiro e Renata Souza. Além dessas, Thaís Ferreira e Benny Briolly, ambas do PSOL carioca e niteroiense, e Tainá de Paula, pelo PCdoB. Todas eleitas como deputadas estaduais e vereadoras, respectivamente. Porém, o que fez Marielle eleita? Com suas pautas, suas escolhas, com seu corpo e expressividade? Partimos do entendimento que esse “efeito” é parcial. Dado o momento de sua eleição e posteriormente ao seu assassinato, já haviam mulheres negras.
Mesmo que em menor número nos parlamentos brasileiros, apesar de serem parte do maior grupo demográfico nacional, mulheres negras continuam sendo indispensáveis ao fazer político neste país para quem quer fazer diferente desde sempre. Pensando nisso, no ano de 2022, o movimento Mulheres Negras Decidem junto com Instituto Marielle Franco uniram forças e lançaram o projeto Estamos Prontas com o objetivo de incidir direta e indiretamente nas eleições de presidência, governo estadual, ao senado, deputados federais e estaduais. Entendendo que as candidaturas às assembléias são forças de pressão interna para cargos do executivo, o Estamos Prontas está fornecendo uma plataforma de impulsionamento para mulheres negras lideranças coletivas através de dois processos: o desenvolvimento de habilidades e o reforço/adensamento de uma rede nacional e internacional, visando mudar a maneira como a pauta pública está estabelecida.
São 27 candidaturas que estão sendo construídas, nos 26 estados e no Distrito Federal. Todas comprometidas com a agenda democrática progressista, porque fazer diferente não significa fazer qualquer coisa. Inclusive, dizer isto significa algo, como por exemplo: defesa dos direitos humanos, ampliação da cidadania, pluralização da participação na política institucional, políticas públicas de proteção à vida comprometidas com dados e valores universais, saúde para todos, educação para todos, segurança para todos, enfim, direitos para todos e não apenas para seletos grupos.
Votar em mulheres negras é votar em um grupo substancial da sociedade brasileira; há muitos anos responsáveis pela construção e edificação de quase tudo que, reconhecidamente, são marcos no avanço da sociedade brasileira, em especial nas áreas de saúde e educação.